2.25.2008

Literatura Infantil III

Ilustrador : Murray Johnson

Com base nas premissas dos posts anteriores (literatura infantil I e II) vejamos alguns excelentes livros clássicos para crianças:

Lusófonos (livros e autores de qualidade):
Autores com um conjunto de obras infantis excelentes ( qualquer título é um valor seguro):
Livros Juvenis (pré adolescência):

A pré adolescência é uma boa altura para introduzir livros que mostram outras realidades sociais e culturais, que incluem temas polémicos, que contém ensinamentos geográficos ou históricos e que abordam sentimentos complexos. A lista que se segue inclui grandes clássicos e também outros autores que selecionei por escolha pessoal. Uma parte dos livros que aparecem na lista de inadequados para crianças no post anterior podem ser lidos nesta idade. Autores que são polimatos como McCall Smith usualmente tem obras com uma maior riqueza.

  • Jack London
  • Mark Twain (Tom Sawyer e Huckleberry Finn)
  • Daniel Defoe (Robinson Crusoe)
  • Arthur Conan Doyle
  • Agatha Christie
  • Enid Blyton (não são particularmente brilhantes os seus livros mas todos nós os lemos e adorámos...)
  • Alexandre Dumas (O conde de monte Cristo)
  • Charles Dickens (Oliver Twist)
  • A. McCall Smith
  • Meshack Asare
  • Isaac Asimov
  • Orwell (1984)
  • Kafka
  • Gil Vicente
  • Branquinho da Fonseca
  • Soeiro Pereira Gomes
  • Alves Redol
  • Mário de Carvalho
Para além do já citado existem várias colectâneas de mitos, lendas, contos de fadas etc.. em diferentes línguas , por exemplo a colectânea dos anos 50 de Italo Calvino ("Fábulas Italianas") com 200 contos tradicionais italianos, o Pentamerone do também italiano Giambattista Basile, um excelente conjunto de contos tradicionais noruegueses (Norwegian folktales) , russos e romenos. Estes contos são muitas vezes variantes do que nós já conhecemos e por vezes não estão traduzidos ou estão out of print.


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Literatura Infantil II

Imagem: Mark Lynch, Ilustrador


Este post é uma continuação do post Literatura Infantil I.


Um livro infantil deve reunir as seguintes "qualidades" para poder ser qualificado como bom:

- Deve contar uma boa história. Seja ela realista ou totalmente imaginária deve ser verosímil contendo personagens não uni/bidimensionais com que a criança se possa identificar e uma trama com pés e cabeça. A história deve estar construída de forma inteligente e apelativa para fomentar a curiosidade e estimular a imaginação.
- Deve estar bem escrito. Erros ortográficos, frases às 3 pancadas e enredo sem nexo ou coerência são pecados mortais.
- Não deve fazer concessões. Frequentemente os escritores cometem o erro de usar linguagem abebezada ou evitar palavras "dificeis". As crianças não são mentecaptas e gostam de livros que contenham coisas que para eles são novas. Aprender e descobrir coisas novas é um dos prazeres da leitura infantil. Obviamente que uma escrita à lá Joyce não é adequada mas textos em que não há riqueza de linguagem não fazem bons livros.

-Deve ser empolgante e divertido. Se não fôr não dará prazer a ler nem criará espectativa! Isto não quer dizer que estejam ausentes da obra temas sérios ou dolorosos.

Outras caracteristicas desejáveis:
- Ser inovadora.
- Ensinar coisas.
Estas 2 características não são obrigatórias e estão ausentes em muitos livros infantis famosos.

A existência de discriminação de qualquer tipo (racial, ideologica, religiosa, de género, de extracto social, cultural, ...) torna instantaneamente e a meu ver um livro infantil num monte de papel para reciclar!
Um livro cuja história não resista ao passar do tempo (não intemporal) perde valor como obra de qualidade (caso de vários clássicos do Séc. XIX).


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Literatura Infantil I

Começa a ser muito irritante a proliferação de listas e livros que apresentam ao leitor os "melhores livros infantis", não porque não apresentem excelentes obras mas pela ausência de títulos não anglo-saxónicos. Outra nuance aborrecida é o facto de quem as escreve não saber de que fala já que muitos destes "best of" incluem frequentemente livros que são totalmente desadequados para crianças. Uma destas listas saiu recentemente no inatacável Telegraph. Intitula-se 100 livros que qualquer criança devia ler e comete os 2 erros de palmatória que mencionei. Será que as crianças inglesas não deveriam ler excelentes livros de autores não anglo ou simplesmente quem compilou a lista não conhece outra coisa?

Partindo do princípio que por literatura infantil se entende livros para idades entre os 3 e os 10 anos, sejam eles lidos pelos próprios ou por terceiros aos petizes, comecemos por perceber que os seguintes livros, frequentemente apresentados como sendo para crianças não o são:

- D. Quixote de la Mancha- É uma novela clássica de cavalaria do Séc. XVII sendo considerado uma das obras mais influentes e fundadora da literatura ocidental. Trata-se de um livro com centenas de páginas, linguagem e termos do séc.XVII e que inclui uma componente de critica social. A segunda metade do livro é uma clara e séria reflexão sobre a desilusão/decepção. Embora a primeira parte tenha sido escrita como sátira é bastante díficil para adultos do Séc. XXI entender parte da comicidade do livro quanto mais crianças.

- As viagens de Gulliver - Foi escrito como crítica ao sistema político e social e inclui opiniões nada lisonjeiras, cruéis e discriminatórias sobre mulheres, crianças e pobres. As viagens, os gigantes e os pigmeus são totalmente acessórios servindo para demonstrar apenas os podres do sistema social da época.

- As aventuras de Huckleberry Finn- Uma das grandes novelas americanas do Séc. XIX, retrata o racismo (e não o defende) nos estados sulistas dos EUA. A história inclui um pai alcoólico e violento, violência racista extrema, a palavra "Nigger" e uma personagem principal- Tom Sawyer- envolvida num gang de pequenos malfeitores. A agressão gratuita e aprisionamento de pessoas com base na sua cor dificilmente será compreendida por crianças actuais (e ainda bem). A linguagem tem um nível de complexidade inadequado a uma criança pré-adolescente.

- O diário de Anne Frank - Por razões óbvias (pelo enquadramento histórico e não pelo conteúdo) é um livro passível de aterrorizar qualquer criança com menos de 10 anos para o resto da vida.

- Heidi/ Mulherzinhas/ Anne of Green Gables e etc..- Estes livros fazem todos parte de um infelizmente enorme conjunto de livros que inferioriza crianças órfãs ou pobres (sobretudo do sexo feminino) e as tenta moldar a um modelo social (feminino) totalmente decadente e desadequado. É o mito do órfão coitadinho! Que foi recolhido por uma bondosa família! e agora tem de trabalhar para o merecer! e portar-se como uma senhorinha da sua condição social! Normalmente estão imbuídos de uma religiosidade beatífica e apresentam sermões morais que provavelmente só vão fazer com que os nossos filhos desenvolvam fortes sentimentos de culpa pelo mínimo pecadilho. A esta categoria junto os inenarráveis livros da "Anita", que no original belga se chama "Martine", retrógrados, sexistas e burguesoídes.

- Tarzan- Uma grande história mas impregnada de racismo e machismo. A pôr de parte.

- O deus das moscas AKA o senhor das moscas- Um livro extremamente visceral sobre a psicologia de grupo, a crueldade das crianças, o poder e a impunidade. Pode parecer bonita uma história com um grupo de meninos sozinhos numa ilha com palmeiras mas não é de todo. Subjacente está uma crítica à organização social e política ocidental.

- As Mil e uma noites (conhecido sobretudo pelas histórias de Ali-Bába, Sinbad, Aladim e Sherazade)- É uma recolha de contos tradicionais milenares persas. No Séc. XI já havia referências à obra e o mais antigo manuscrito que existe desta data do Séc. XIV e encontra-se na Biblioteca nacional de Paris contendo cerca de 300 contos. Actualmente, as mil e uma Noites são compostas por vários volumes que agregam tradicionais histórias Persas, Sírias, Egípcias, Iemenitas e de outros países vizinhos. Existem várias versões de vários tradutores com extensão igualmente variável. O original não incluia nem o Ali-Bába, nem o Aladim nem o Sinbad. Estas 3 histórias foram acrescentadas por ocidentais que traduziram a obra. As histórias originais incluíam muito erotismo com virgens muçulmanas, pederastia e passagens claramente obscenas. Se vai comprar esta obra ou um livro com contos dela retirados certifique-se que é uma versão adequada para crianças e que é uma tradução ou adaptação de qualidade.

- Grandes Esperanças- O magistral clássico de Dickens não foi escrito com o intuito de entreter crianças. O livro centra-se na vingança, no ressentimento, no sofrimento e nas diferenças entre classes sociais. Pouco adequado para crianças.

-Moby Dick- O épico de Melville tem um nível de complexidade que não pode ser apreciado ou explicado devidamente a uma criança. Das referências bíblicas às metáforas usadas para exprimir conceitos abstractos, dos longos solilóquios ao simbolismo de várias passagens, o estilo caleidoscópico da obra-prima de Melville não é de leitura fácil. A perseguição obsessiva à Baleia pode ser deixada para mais tarde.

O facto de os livros acima não serem para crianças, não invalida que se faça uma narração oral da história(s) expurgada da parte desadequada, oferecer estes livros a miúdos é que não é boa ideia.

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Óscares

Parece que o júri dos óscares veio ao Figmento ler quem devia premiar. Todos os palpites foram na mouche.

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2.19.2008

Alexandra David-Néel

Alexandra David-Néel, nascida Louise Eugénie Alexandrine Marie David era uma mística e exploradora francesa, feminista com uma faceta levemente anarquista e uma fortuna considerável. Alexandra, que era budista, viveu no tibete durante 14 anos (como eremita durante algum tempo), tornou-se lama e escreveu dezenas de livros sobre religião, viagens e espiritualidade. Atribuia a sua longevidade à meditação e ao budismo (viveu 101 anos). Com 20 anos já tinha viajado sózinha por uma parte da Europa e pela India após fugir de casa. Seguiu-se o Tibete, a China, o Japão, a Mongólia, a Coreia, a Tunísia (onde conheceu o futuro marido) e a URSS. Tudo isto não seria nada de especial se fosse hoje, mas aconteceu no Séc.XIX e inicio do Séc.XX.

Em 1912 Alexandra avistou-se com o Dalai Lama (13º) e esteve em Lhasa que na altura estava interdita aos ocidentais. Foi a primeira mulher ocidental a pisar solo tibetano. Durante a 2ª guerra mundial atravessou a China e a URSS. Esteve na China durante a guerra civil e durante a segunda guerra sino-japonesa. Dedicou-se ainda ao canto lírico durante um breve período tendo adquirido alguma notoriedade como soprano. Frequentou a Sorbonne numa altura em que não era permitido às mulheres matricularem-se lá. Estudou em Londres e falava fluentemente várias linguas. Aos 100 anos ainda solicitou a renovação do passaporte em França!


referências:
  • The Secret Lives of Alexandra David-Neel - A Biography of the Explorer of Tibet and Its Forbidden Practices, Barbara e Michael Foster.
  • Alexandra David-Neel, Ruth Middleton.
  • Livro de Alexandra David-Neel sobre as viagens no Tibete de 1927 - Voyage d'une Parisienne à Lhassa (My Journey to Lhasa).

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LEGO



(1)

O fabrico de Lego começa com a alimentação de ABS (1) (estireno butadieno acrilonitrilo) granulado já com cor aos moldes (2).
(2)
O granulado é derretido nos moldes metálicos à temperatura de 230 ºC e moldado a alta pressão. Depois de moldados são arrefecidos e transportados mecanicamente até à secção de armazenamento (3) onde ficam arrumados por cor e tipo de peça em caixas.
(3)
O fabrico do Lego é quase todo realizado no seu país natal, a Dinamarca, de forma automatizada e com pouca intervenção humana. A mistura das peças para fazer conjuntos e a embalagem final é feita em fábricas fora da Dinamarca. A vantagem de não fazer outsourcing do fabrico está à vista, pouca pirataria e contrafacção e apenas 18 peças defeitousas em cada milhão fabricado.


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Deprimente

É sempre deprimente saber que os blogs portugueses mais visitados são coisas estranhas como Portal de columbofilia (ratos com asas blargh!), Videos do Gato fedorento (não viram já isto tudo?), Vários de Contos porno e fotos porno para homens (o Homem português parece ser o macho mais frustrado do mundo), Mirandela gay (com videos porno gay), A ressaca (incentiva consumo de doses maciças de alcóol como um feito heróico), vários sobre futebol, novo_download (informações sobre como piratear coisas). Se compararmos com a Noruega um país verdadeiramente civilizado em que temos uma lista dos mais visitados composta por :
1-
Beerdhiga::: Warar sugan daafaha aduunka
2-Buurhakaba Media
3- Øystein Kvaal Østerbø
4-Midt-Troms slektsregister




(os 2 primeiros são em somali e não em Norueguês mas isso agora não interessa nada. Até porque eu não sei norueguês por isso também não sei de que são os outros).

Prognósticos só depois dos Óscars


Vaticinios para os Óscares


Estou a dedicar-me à maratona de ver todos os candidatos de enfiada. Ainda faltam os importantes Vale de Elah e Haverá sangue.

Uma desilusão forte foi Sweeney Todd. Como Gore não é para levar a sério com as suas personagens bidimensionais e uma costela moralista. Como entretenimento pisa demasiado o risco; Há litradas de sangue, muitos cadáveres e aquelas populares tartes. É um Dickens com um serial killer. Mas infelizmente ele canta. Todos cantam e ...muito mal. Aquelas cançonetas não lembram a ninguém ó Burton. O filme conta-se numa frase: " A vingança serve-se fria e paga-se cara".

Saltemos para o filme dos irmãos Cohen onde o dinheiro tudo corrompe. Bardem o serial killer tarado rouba todo o filme com a sua pistola de ar comprimido de matar gado. Um homem fazer uma interpretação assim e ter simultaneamente aquele penteado... já ganhou o óscar! O filme não é só Bardem, as imagens do deserto são reminiscentes de um grandioso John Ford, o incessante vaguear forçado do personagem principal teleporta-nos para road movies como Bonnie and Clyde. O filme é um forte candidato a melhor filme e melhor realização. E sempre que Bardem aparece lá nos encolhemos na cadeira.

Michael Clayton é um filme espertalhaço com uma trama ao estilo de Syriana onde o competente Clooney também entrava. Lá para o meio do filme começamos finalmente a perceber as ligações entre os diferentes personagens e o puzzle começa a compôr-se. O filme vive mesmo desse efeito de puzzle já que a trama é simples e banal. Há uma empresa de advogados onde Clooney trabalha que está a defender uma grande empresa num longo e importante processo judicial que mete OGMs, pelo meio há gente muito ruim e tudo acaba bem porque Clooney é o maior. Tilda Swinton é irrepreensivel no papel de cabra pérfida e cruel, mas no fim trama-se porque Clooney já tomou um Nespresso what else! e não anda a dormir.
Tilda leva nas calmas o óscar de melhor secundária se a Blanchett não lho roubar. (Quanto a Clooney ganhará um óscar quando fizer uma personagem gay e tirar a roupa).


Nas animações não me parece que o sensaborão Surfs up consiga bater o delicioso Ratatouille. E o Persepólis tem uma animação que parece iguazinha aos desenhos da novela gráfica em que se inspira.

Quanto a actor principal, realizador e melhor filme: vai ser preciso ver o Haverá sangue e o Vale de Elah para apostar. Os restantes candidatos não me parecem ter actuação à altura, só Day-Lewis ou Tommy Lee Jones ganharão.

O ano foi pobre em espaço para papeis femininos. Basta uma volta pelos nomeados para ver que na maior parte dos filmes não há papeis principais femininos. Discriminação no seu melhor. A excepção é a brilhante Marion Cotillard que tem vindo a coleccionar prémios com a sua Piaf em La vie en rose/ la môme. Mas o facto de se tratar de uma actriz desconhecida nos EUA e ser um filme europeu pode não a beneficiar.

Uma pequena nota para as nomeações de curtas metragens animadas, onde pontua um filme fantástico já lançado no mercado português: "Pedro e o Lobo" de Suzie Templeton com a música de Prokofiev é uma animação stop motion que o próprio Prokofiev teria adorado! (critica no Times). O filme tem cerca de 30 minutos. Este é o único filme nomeado nesta categoria que já vi. No entanto vi "the old man and the sea" um filme anterior de Petrov que ganhou em 1999. Petrov é nomeado este ano com "my love" (moya lyubov no original) um filme que parece usar as mesmas técnicas de animação e estilo gráfico do de 1999 (pintura a óleo sobre vidro). Conhecendo o trabalho de Petrov diria que o filme dele deste ano é de certeza um forte candidato.

Ah, pois, não vale a pena falar de Juno e Expiação. Juno está lá porque é politicamente correcto pôr uma parvoíce com um tema daqueles e Expiação está lá porque tinha de lá estar mas enfim não acrescenta nada.


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